A menina do brinquedo quebrado
Esse poema eu o senti há oito dias, quando fui na segunda-feira da semana passada tomar o café da manhã numa padaria no bairro de Petrópolis, em Natal. De repente me veio à mente a imagem de uma menina com um brinquedo quebrado nas mãos, e que a todos o mostrava, entre esperançosa e desconsolada, mas estranhamente orgulhosa de seu brinquedo quebrado. Era um sentimento tão nobre que pensei que não iria conseguir transcrevê-lo, e fiquei muito feli z ao vê-lo assim em versos tão simples.
Agora lembro de algo que me ocorreu uns dez dias antes, quando de plantão num hospital psiquiátrico público de Natal. Atendi a um casal, um mestre de obras e sua mullher, ambos na faixa dos vinte e poucos anos; o pedreiro estava tendo sucesso na profissão, era inclusive o responsável pelo pagamento dos demais funcionários. Como a empresa demorou a repassar-lhe o dinheiro, ele ficou sem dormir, e com idéias de que o estavam tentando prejudicar deliberadamente, irritadiço, ansioso. É que muita gente ia cobrar-lhe o dinheiro, e ele n]ao tinha como atender aps queixosos. Não sei como descrever o desespero daquela jovem mulher diante da poissibilidade de o marido estar enlouquecendo logo naquele momento em progredia na profissão... Temi pelo píor diante do quadro, isso era por volta da uma hora da tarde. Felizmente, após uma boa soneca provocada por sedativos potentes, o homem, lá pelas dezoito e trinta horas, estava bem disposto e equilibrado, próprio a enfrentar a vida, e pude atender ao pedido da mulher para liberá-lo de volta á sua cidade,. na periferia da Grande Natal.
Ah, como ninguém é obrigado a saber francês, traduzo os versos de Baudelaire no poema "Ao leitor", em epígrafe no meu: "Hipócrita leitor, meu igual (semelhante), meu irmão".
absaam
A MENINA DO BRINQUEDO QUEBRADO
"Hypocrite lecteur, mon semblable, mon frère!"
Eu vi a menina
que ia e que vinha
e em suas mãos tinha
um brinquedo quebrado.
E a todos mostrava
o seu sonho desfeito
- Ainda terá jeito
o brinquedo quebrado?
Há quem passe apressado,
há quem dê atenção;
há quem pegue na mão
o brinquedo quebrado.
Um se irrita, outro ri,
um tenta consolar;
outro quer consertar
o brinquedo quebrado.
Um estica, outro puxa,
há quem dê um aperto...
Mas não tem mais conserto
o brinquedo quebrado...
* * *
Tu conheces aquela menina
que senta na calçada
triste e desconsolada,
seu corpinho abraçado
a um briquedo quebrado?
Pois ela é nossa mãe,
vida, amante e amada;
nossa irmã que por nada
perde a estranha esperança
de voltarmos a ser
novamente a criança
que ela pôde ver
- manhã ensolarada!
O brinquedo sou eu
e és tu - Somos nós!
Desgraçado o que é
de si próprio o algoz;
e que se aos demais
diz sempre estar melhor,
a si mesmo não nega
que se torna pior.
Ainda que cansada
persiste no caminho.
Acha em seu coração
- poço estranho! - um carinho.
E o brinquedo quebrado
por seus dedos tocado
soluça qual um pinho.
Só por ela lembrado,
só por ela guardado,.
só por ela escutado...
O brinquedo quebrado.
Porque assim é aquela menina...
- Tu a conheces, leitor!
Antônio Adriano de Medeiros
agos - 2011
domingo, 14 de agosto de 2011
A MENINA DO BRINQUEDO QUEBRADO
Publicada por M.A. à(s) 10:39
Etiquetas: Antônio Adriano de Medeiros
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