segunda-feira, 3 de maio de 2010

Yorgos Seferis (Grécia,1929.1975),Prémio Noel da Literatura em 1963

MICENAS

Dá-me as tuas mãos, dá-me as tuas mãos,
dá-me as tuas mãos.

Vi dentro da noite
o cimo agudo do monte
vi além a planície inundada
com a luz de uma lua por aparecer
vi, ao voltar a cabeça
as pedras negras contraídas
e a minha vida tensa como corda
princípio e fim
o último momento;
as minhas mãos.

Afunda-se quem levanta as grandes pedras
estas pedras levantei-as enquanto suportei
estas pedras. O meu destino.
Ferido pelo meu solo
tiranizado pela minha túnica**
condenado pelos meus próprios deuses,
estas peras.

Sei que não sabem, porém eu
que segui tantas vezes
o caminho do assassino ao assassinado
do assassinado à paga
da paga ao outro asassínio,
a púrpura inesgotável
aquela tarde do regresso
quando as Solenes começaram a silvar
na erva escassa —
vi as serpentes em cruz com as víbiras
entretecidas sobre a linguagem má
o nosso destino.

Vozes das pedra e do somo
mais fundas aqui onde o mundo escurece,
memória da fadiga enraizada no ritmo
Que bateu na terra com os pés
Esquecidos.
Corpos afundados nos alicerces
do outro tempo. Nus. Olhos
fixos fixos, num sinal
que por mais que queiras não distingues;
a alma
que luta por tornar-se a tua alma.

Nem já sequer o silêncio é lei
aqui onde as mós pararam.

Out. de 1935
Em De Gymnopedia*

Trad. de Joaquim Manuel Magalhães e Nikos Pratisinis

Relógio d’Água,Lisboa, 1993

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